Receber férias
com atraso dá direito a pagamento em dobro
Notícias do Tribunal Superior do Trabalho
14/11/2006
A finalidade das férias é permitir ao trabalhador o descanso
anual em condições e ambiente diferentes daqueles em que costuma executar suas
tarefas e em que vive de forma cotidiana, a fim de preservar sua saúde física e
mental. O pagamento com atraso da remuneração relativa ao período das férias
subverte essa finalidade, e por isso deve gerar o direito ao recebimento em
dobro por parte do trabalhador. Com este entendimento, a Primeira Turma do
Tribunal Superior do Trabalho deu provimento a recurso de revista de uma
ex-zeladora da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) e determinou o
pagamento em dobro das férias pagas com atraso, em processo relatado pelo
ministro Vieira de Mello Filho.
A zeladora foi admitida pela Unisul, na cidade de Tubarão (SC), em julho de
1995. Quase dez anos depois, em janeiro de 2005, foi demitida sem justa causa e
ajuizou reclamação trabalhista pleiteando diversos direitos. Alegou, entre
outras coisas que, embora o abono de 1/3 fosse pago antecipadamente, sempre
recebia o restante da remuneração quando retornava do período de férias,
pedindo, portanto, seu pagamento em dobro.
O juiz da 2ª Vara do Trabalho de Tubarão deferiu o pedido fundamentado,
principalmente, na economia e na celeridade processuais. “A prática tem
demonstrado que o indeferimento da pretensão [do pagamento em dobro no caso de
atraso na remuneração de férias] tem levado os processos até o TST, com
provimento favorável aos trabalhadores”, registrou na sentença.
O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (Santa Catarina), porém, ao julgar
recurso ordinário da Unisul, excluiu da condenação a dobra das férias. O TRT
entendeu que, se o empregado goza as férias a que tem direito sem receber a
antecipação (que deve ser paga até dois dias antes do início, conforme o artigo
145 da CLT), cabe apenas a aplicação de multa ao empregador.
A zeladora recorreu então ao TST, insistindo no pagamento em dobro. O ministro
Vieira de Mello Filho ressaltou que a questão reside em saber se o comportamento
adotado pela Unisul, ao pagar as férias após seu efetivo gozo, caracteriza
infração administrativa (artigo 153 da CLT) ou se importa o pagamento em dobro.
No seu entendimento, a regra do artigo 145 da CLT “não poderá perder de vista a
regra constitucional do artigo 7º, inciso XVII, que assegura a gratificação
antecipada de 1/3 para as férias”. A interpretação da norma constitucional,
juntamente com a da CLT, “retira a possibilidade de se concluir pela
caracterização de mera infração administrativa, porque a questão refoge ao
âmbito da disponibilidade das partes no contrato de trabalho, e da
responsabilidade trabalhista ou administrativa dela decorrente”, ou seja, a
regra da CLT passa a ter o mesmo status constitucional do abono de 1/3.
Com esta fundamentação, Vieira de Mello Filho afirma que o pagamento fora do
prazo demonstra “desatenção ao espírito da norma, tornando sem efeito o
pressuposto das férias remuneradas, criado, especificamente, com o intuito de
que fosse possibilitado ao empregado condições financeiras para o gozo de seu
período de descanso da melhor forma que lhe aprouvesse”.
Para o ministro relator, “o desrespeito à ordem constitucional quanto ao
pagamento extemporâneo das férias conspira contra os valores da preservação da
saúde e segurança no ambiente de trabalho e, para se garantir a efetividade da
norma, impõe-se interpretação de caráter inibitório” – ou seja, o pagamento em
dobro, para desestimular o empregador a proceder de forma incorreta.
Quanto à interpretação dada à questão, o relator destacou que o juiz, “sendo o
criador da lei individualizada ao caso concreto, deve encontrar meios de tornar
esta norma eficaz e exeqüível e não, covardemente, negar-se a cumprir os
mandamentos constitucionais sob o argumento de que não existe legislação
integradora dispondo sobre a matéria”.
Por unanimidade, a Primeira Turma deu provimento ao recurso e restabeleceu a
condenação ao pagamento da dobra relativa às férias não remuneradas à época
própria, nos termos da decisão da 2ª Vara do Trabalho de Tubarão. (RR
996/2005-041-12-00.6)
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