Brigas entre chefe e subordinada nem sempre configuram dano moral
Fonte: TST - Adaptado pelo Guia Trabalhista
14/06/2007
“Nem sempre o difícil relacionamento entre o chefe e o
subordinado gera dano moral. O difícil relacionamento entre eles pode,
eventualmente, ser ofensivo, se o tratamento que o chefe dispensa ao subordinado
vem permeado pelo propósito de humilhar ou de reduzir sua importância no
contexto da unidade profissional”. Balizada nessa linha de raciocínio, a Quinta
Turma do Tribunal Superior do Trabalho, acompanhando o voto do relator, ministro
João Batista Brito Pereira, reformou decisão do Tribunal Regional do Trabalho da
3ª Região (MG) que havia concedido R$ 100 mil de indenização por danos morais a
uma ex-servidora de um Banco.
A dramática história relatada pela bancária aposentada está inserida em oito
volumes do processo trabalhista iniciado em junho de 2001, revelando a
conturbada relação entre chefe e subordinada, que culminou com pedido de
indenização por danos morais e físicos em torno de R$ 700 mil. De um lado da
contenda, uma advogada, admitida por concurso público como escriturária, que se
disse perseguida de forma “criminosa” por seu chefe. De outro, o Banco, que
baseou sua defesa no fato de a empregada ter sido diagnosticada por psiquiatra
como portadora de transtorno bipolar, o que a levaria a fantasiar exageradamente
as situações vivenciadas no ambiente de trabalho.
A empregada entrou para os quadros do Banco em 1984. Disse que, apesar de ter
sido admitida como escriturária, desenvolveu por longos anos a função de
digitadora, vindo a adquirir doença profissional conhecida por Lesão por
Esforços Repetitivos (LER). Segundo consta na petição inicial, o mal teria
atingido o braço direito, causando-lhe dores fortes, a ponto de ficar
impossibilitada para o trabalho e ter sido afastada por diversas vezes pelo INSS
com recomendação de submissão a tratamento pelo Centro de Reabilitação
Profissional do instituto social.
As constantes licenças médicas, segundo ela, teriam desagradado à chefia, e a
relação entre chefes e subordinada ficou tão conturbada que algumas vezes
chegaram até mesmo às vias de fato. Na visão da empregada, a perseguição
sistemática desenvolvida por seus superiores foi tão intensa que a levou a
apresentar um quadro clínico de profunda depressão. Ela foi aposentada
prematuramente, aos 36 anos, não pela LER, mas por ser portadora de transtorno
bipolar. A doença, conhecida antigamente pelo nome de psicose
maníaco-depressiva, caracteriza-se por alterações do humor, com episódios
depressivos, eufóricos e maníacos.
Na ação trabalhista intentada contra seu empregador, a escriturária pediu,
dentre outras verbas, o reconhecimento da culpa do Banco pela aposentadoria
precoce por invalidez, com indenização por danos morais de 100 salários de um
advogado pleno do Banco e por danos físicos no valor de R$ 500 mil, além de
pensão para cobrir as perdas salariais que teria se fosse ativa.
O banco, em contestação, negou a ocorrência do dano moral e disse que as
“perseguições” alegadas pela empregada não passavam de “delírios” provenientes
da doença. Apresentou diagnóstico de psiquiatra atestando que a empregada sofria
problemas de ordem emocional, inclusive com episódios de tentativas de suicídio.
Concluiu alegando que a bancária teve atritos em todos os setores onde
trabalhou.
O magistrado de primeiro grau ouviu testemunhas e analisou a farta documentação
carreada pelas duas partes e concluiu pela existência do dano moral. “A
empregada enfrentou ambiente hostil, de descaso e perseguição sistemática. Dizer
que isso não passa de delírio, postura sintomática de seus males psíquicos, é
prosseguir na conduta antijurídica de vilipendiar a reclamante, fazendo sangrar
feridas que ainda não cicatrizaram”, destacou o juiz. O pedido de indenização
por danos físicos foi julgado improcedente, mas o banco foi condenado a pagar R$
100 mil pelos danos morais.
Houve recurso de ambas as partes ao TRT/MG, mas a condenação em danos morais e o
valor arbitrado da indenização foram mantidos. “A empregada sofreu doença
profissional que a impossibilitou parcialmente para o trabalho desde 1989
quando, também, foi constatado estar ela acometida de ansiedade e depressão.
Tratava-se, portanto, de uma empregada já atingida pelo infortúnio e acometida
de séria doença não profissional, ou seja, a depressão bipolar, que a levou a
aposentar-se por invalidez, precocemente. Merecia, portanto, toda a atenção e a
compreensão de sua chefia e dos seus colegas de profissão, devendo ser tratada
com cortesia e, mesmo, com a ajuda e amparo de todos. A prova oral produzida,
porém, confirmou sua alegação feita na inicial em relação ao rude tratamento
recebido de seu chefe, fazendo-a enfrentar um ambiente hostil”, destacou o
acórdão do TRT.
A matéria chegou ao TST por meio de recurso das duas partes: o agravo de
instrumento da empregada não foi provido e o recurso de revista do Banco recebeu
provimento para, reformando o acórdão do regional, julgar improcedente o pedido
de indenização por dano moral.
De acordo com o voto do ministro Brito Pereira, o TRT registrou no acórdão que o
tratamento do preposto do banco dispensado à empregada não revelou situação de
humilhação. Ao contrário, o TRT esclareceu que o Banco procurou readaptar a
escriturária, que ficara impossibilitada parcialmente para o trabalho por algum
tempo, além de confirmar que ela foi acometida de ansiedade e depressão bipolar,
doença não profissional, que gerou a aposentadoria por invalidez.
“Do exame dos fatos extraídos do acórdão regional, vê-se que estão ausentes os
pressupostos ensejadores do dever de indenizar, dado que o mau relacionamento ou
as divergências de entendimentos no ambiente de trabalho, tal como narrados pelo
Tribunal Regional, não passaram de meras divergências entre advogados, nem ficou
revelado qualquer propósito de humilhar a reclamante no seio da unidade
profissional onde ambos trabalhavam”, disse o ministro relator. Segundo ele,
para a configuração do dano moral concorrem três pressupostos básicos: o dano
propriamente dito; a culpa ou dolo do agente a quem se imputa a ação ou omissão;
e o nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente. “Na espécie,
contudo, do que se extrai do acórdão recorrido, nem mesmo o dano se configurou,
porque o sofrimento da reclamante não decorreu de ato do preposto do reclamado”,
concluiu.
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