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INTERPRETAÇÃO TÉCNICA IBRACON n°. 02/2006

NPC 22 – Provisões, Passivos, Contingências Passivas e Contingências Ativas

Apresentação

Em outubro de 2005, o Ibracon publicou a Norma e Procedimento de Contabilidade no.° 22 (NPC 22), aprovada pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM, por meio da Deliberação CVM n°. 489, de 3 de outubro de 2005. O Conselho Federal de Contabilidade – CFC editou a NBC – T – 19.7, por meio da Resolução no. 1.066, de 21 de dezembro de 2005, com igual teor da NPC 22.

A edição dessa NPC cumpre com o programa de trabalho estabelecido pelo Ibracon na busca da harmonização das normas contábeis brasileiras às internacionais. Assim, a matriz dessa NPC é a Norma Internacional de Contabilidade no. 37 (International Accounting Standard 37).

Dada a importância dessa norma e as dificuldades inerentes ao assunto relativo aos passivos tributários e às provisões em geral, o Ibracon edita a presente Interpretação Técnica, com o apoio de consultores jurídicos, com a finalidade de esclarecer assuntos que têm gerado dúvidas para a implementação plena da NPC 22, notadamente os seguintes: (a) conceito de obrigação legal; (b) interpretações legais no contexto da NPC 22; (c) alcance e interpretação do exemplo 4(a) incluso no Anexo II e (d) efeitos da adoção inicial da NPC 22.

Conceito de obrigação legal

Determinados termos, utilizados no contexto da NPC 22, tiveram seus significados definidos no item 6. Mais precisamente, o item 6(vi) estabelece: “uma obrigação legal é aquela que deriva de um contrato (por meio de termos explícitos ou implícitos), de uma lei ou de outro instrumento fundamentado em lei.”

Por sua vez, o art. 5°, inciso II, da Constituição Federal, estabelece: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Em matéria tributária, o inciso I do art. 150 da Constituição Federal veda: “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”. Logo, a lei é uma das causas geradoras das obrigações, e dela originam-se diversas imposições que incluem a obrigação de pagar tributo.

Assim, sem prejuízo da discussão dos efeitos que a lei produz e de sua inter-relação com as normas complementares, mas considerando que a prática de qualquer ato, que não seja mediante a existência de uma lei correspondente, não terá como efeito produzir uma obrigação para a entidade, o Ibracon definiu obrigação legal, em matéria tributária, considerando a lei como marco referencial.

Interpretações legais no contexto da NPC 22

Para que ocorra a obrigação tributária, a entidade tem que praticar o ato necessário e suficiente previsto em lei para sua ocorrência. Quando houver incerteza se o ato praticado pela entidade enquadra-se de forma suficiente na norma legal que prevê a exigência de um tributo, ou se esse ato se enquadra em mais de uma hipótese de incidência da norma tributária, a decisão se haverá ou não registro contábil de uma obrigação ou qual obrigação será devida dependerá não só do entendimento da administração da entidade, mas da interpretação e da opinião do especialista em matéria tributária. Nessa situação, diante de uma norma legal, poderá haver dúvidas se o ato praticado pela entidade é o mesmo que o previsto na lei e, por conseguinte, haverá também dúvidas quanto à existência da obrigação.

Se existirem dúvidas quanto à existência da obrigação legal, por questões de interpretação, e que diferem das discussões tratadas no item D a seguir, sobre constitucionalidade, uma das condições estabelecidas no item 10 da NPC 22 não foi atendida. Como esse item determina que as três condições sejam atendidas simultaneamente, pode ser que se esteja diante de uma situação de contingência passiva, analisada no item 22 da NPC, e não em uma situação que seja requerido o registro contábil de uma obrigação tributária.

Em relação aos aspectos de interpretação, podem existir situações em que as autoridades fiscais determinam algum procedimento por meio de normas complementares eventualmente diferente daquele previsto em lei. Outra situação poderia ocorrer nos processos de fiscalização do cumprimento das obrigações tributárias, conduzidos pela autoridade fiscal, em que a entidade recebe notificação para o recolhimento complementar de tributo, anteriormente recolhido segundo sua melhor interpretação da legislação tributária. Nesse contexto, a notificação em si, normalmente seguida de uma discussão administrativa ou judicial, pode não conter todos os elementos para resolver as incertezas sobre os fatos relacionados à eventual controvérsia. O início de uma discussão é mais uma das circunstâncias a levar em consideração para determinar se existe uma obrigação presente e, por conseqüência, um passivo a ser contabilmente registrado.

Alcance e interpretação do exemplo 4(a) incluso no Anexo II da NPC 22

Além dos exemplos contidos na norma original (IAS 37), o Ibracon entendeu ser necessário incluir outros, contemplando assuntos de especial relevância para o mercado brasileiro. Assim, foi incluído o exemplo 4(a) no Anexo II, sobre tributos, reproduzido a seguir:

“A administração de uma entidade entende que uma determinada lei federal, que alterou a alíquota de um tributo ou introduziu um novo tributo, é inconstitucional. Por conta desse entendimento, ela, por intermédio de seus advogados, entrou com uma ação alegando a inconstitucionalidade da lei. Nesse caso, existe uma obrigação legal a pagar à União. Assim, a obrigação legal deve estar registrada, inclusive juros e outros encargos, se aplicável, pois estes últimos têm a característica de uma provisão derivada de apropriações por competência. Trata-se de uma obrigação legal e não de uma provisão ou de uma contingência passiva, considerando os conceitos da NPC.

Em uma etapa posterior, o advogado comunica que a ação foi julgada procedente em determinada instância. Mesmo que haja uma tendência de ganho, e ainda que o advogado julgue como provável o ganho de causa em definitivo, pelo fato de que ainda cabe recurso por parte do credor (a União), a situação não é ainda considerada praticamente certa, e, portanto, o ganho não deve ser registrado. É de se ressaltar que a situação avaliada é de uma contingência ativa, e não de uma contingência passiva a ser revertida, pois o passivo, como dito no item anterior, é uma obrigação legal e não uma provisão ou uma contingência passiva.”

Nesse caso, enquanto vigorar a lei, existe uma relação jurídica que estabelece uma obrigação legal entre o contribuinte e a União. Em razão da existência dessa relação jurídica, os respectivos efeitos produzidos pela vigência da norma devem ser registrados contabilmente como contas a pagar.

A obrigação legal, anteriormente descrita, somente deixará de existir quando a relação jurídica que a originou deixar de produzir, definitivamente, os efeitos que lhe são pertinentes. Essa relação jurídica terminará quando houver decisão definitiva acerca de sua inconstitucionalidade proferida em instância competente, ou caso haja o seu efetivo cumprimento por meio de pagamento ou outra forma de extinção da obrigação tributária.

Note-se que a suspensão da exigibilidade do pagamento da obrigação tributária, provocada por meio de recursos legais iniciados pela entidade, não afeta a existência dessa obrigação. A obrigação legal existe, mas não é, no momento, exigível.

O exemplo acima tem o objetivo de distinguir os efeitos de uma obrigação legal, a qual deve ser tratada como “contas a pagar”, e os efeitos da suspensão de sua exigibilidade sob argüição de inconstitucionalidade.

O item 6(vi) da NPC 22 define uma obrigação legal como aquela que deriva de um contrato, de uma lei ou de outro instrumento fundamentado em lei, enquanto o item 18 dessa mesma NPC trata da saída provável de recursos para liquidar uma obrigação.

Para efeitos dessa definição, há de se observar que uma lei é editada com presunção de legitimidade, com o que serão raros os casos em que se poderá considerar improvável o desembolso de recursos para fazer frente à obrigação ou argüir a não-existência de obrigação legal instituída.

Nesse contexto, e considerando a convenção da objetividade, as demonstrações contábeis devem ser elaboradas de acordo com uma concepção mais segura e objetiva em relação aos fatos que afetam o patrimônio da entidade. Todavia, nem toda circunstância de ordem objetiva consegue exprimir a melhor avaliação. Sempre caberá ao profissional da Contabilidade efetuar julgamento, segundo as normas que regem a profissão contábil, fazendo uso do trabalho de especialistas, principalmente nos casos que envolvem matéria de natureza legal ou tributária, como é o caso específico deste tópico. Em decorrência desse exercício de julgamento, podem existir situações que permitam concluir, mesmo que em raros casos, com base em concretas evidências, que determinadas leis, ainda que vigentes, não produzirão os efeitos patrimoniais que lhes seriam pertinentes.

O exemplo incluso no item 4(a) do Anexo II da NPC 22, portanto, não tem o objetivo de alterar a norma da qual faz parte, ou seja, não se elimina o julgamento da administração sobre a legislação editada, conforme descrito no tópico relativo à interpretação legal; porém, repita-se, serão raras as situações nas quais não fica caracterizada a existência de uma obrigação legal em decorrência de uma lei, que permitiriam à administração da entidade deixar de fazer o registro contábil de um passivo.

Efeitos da adoção inicial da NPC 22

Nos termos do item 79 da NPC 22, esta “entra em vigor para as demonstrações contábeis que abrangem os períodos que começam em 1º. de janeiro de 2006, ou após essa data, incentivando-se sua aplicação imediata ...” e, nos termos do item 77, “os efeitos da adoção dessa NPC que não se relacionarem a mudanças de estimativas devem ser apresentados como ajustes de exercícios anteriores.”

As maiores dúvidas que têm surgido na aplicação da NPC relacionam-se ao tratamento a ser dado para situações em que as entidades estão discutindo a validade de alguma legislação e que à época de sua edição, com base em parecer de seus consultores jurídicos, não fizeram o registro correspondente. Estariam as entidades obrigadas a fazer o registro a partir de 1°. de janeiro de 2006 (data de entrada em vigor da NPC), como ajuste de exercícios anteriores, pois se tratava de obrigação legal?

Como enfatizado anteriormente, o objetivo da NPC não é eliminar o julgamento da administração da entidade e sim, entre outros, disciplinar o registro de passivos de origem tributária. Assim, não se busca requerer das entidades que se faça o registro contábil de passivo para todas aquelas demandas judiciais em curso (“estoque”) que tiveram origem em contestação de legislação.

O que deve prevalecer é um julgamento criterioso, considerando-se a própria NPC 22 e os termos discutidos a seguir.

Como parte normal do processo de encerramento das demonstrações contábeis, as entidades são requeridas a efetuar análise da situação das questões tributárias em aberto na data das demonstrações contábeis. Em 2006, primeiro ano de adoção dessa norma, essa análise requer cuidados especiais. Ao aplicar os conceitos trazidos pela NPC 22, a administração deve exercer seu julgamento considerando os princípios contábeis, mais especificamente as Convenções do Conservadorismo, da Objetividade e da Consistência, que constam da Estrutura Conceitual Básica da Contabilidade.

Com a finalidade de apoiar os responsáveis pela elaboração e pela aprovação de demonstrações contábeis, usuários e profissionais da área contábil, incluindo os auditores independentes, nessa questão, o Ibracon buscou, no conjunto de princípios e normas contábeis, determinadas condições gerais, que deverão ser consideradas cumulativamente na utilização do julgamento para registrar ou não os efeitos decorrentes da adoção inicial da NPC 22:

1. Existência de jurisprudência pacificada nos órgãos que tenham o poder de deliberar de forma definitiva sobre a matéria controversa.

2. Opinião dos advogados patrocinadores da causa quanto à inexistência de falhas processuais ou de outros problemas que poderiam impactar na decisão do processo concreto da entidade, além de uma avaliação quanto ao desfecho da causa.

3. Evidências de que a norma prevista na lei não acarretará redução patrimonial futura. Essa evidência inclui o consenso que pode ser obtido de especialistas qualificados de notória experiência, conhecimento e projeção na matéria-objeto da controvérsia.

A jurisprudência acima referida deve ser entendida como o conjunto de decisões reiteradas dos órgãos julgadores, que tenham poder de deliberar definitivamente acerca dos fatos em litígio, em casos idênticos ao da entidade. Nessa situação, deve-se levar em consideração a aplicação de todas as circunstâncias que nortearam as decisões e o fato efetivamente julgado, correlacionando-o e integrando-o aos elementos de identidade do fato propriamente praticado e à situação da entidade que o praticou.

A expressão “pacificada”, para qualificar a jurisprudência, tem como objetivo definir que as decisões deverão ter o condão de indicar a tendência firme de julgamento daqueles órgãos, ou seja, não basta que haja somente uma enorme quantidade de decisões a respeito da matéria sob avaliação, mas essa quantidade deverá indicar qualitativamente que haverá a tendência de a matéria ser decidida no mesmo sentido das que foram apresentadas fundamentando todo o processo.

Nas raríssimas circunstâncias em que a administração julgar, com o apoio de especialistas e com base nas condições gerais descritas acima, que uma determinada lei, ainda que vigente, não produz efeitos legais para a entidade para fins da adoção inicial da NPC 22, a administração deverá documentar apropriadamente seu julgamento e dar plena divulgação, nas demonstrações contábeis, da existência da lei, das bases de seu julgamento e dos montantes envolvidos.

Na mesma linha, outra dúvida é quanto à necessidade ou não de fazer o registro contábil dos mesmos assuntos em discussão judicial, mas para fatos geradores novos, ou seja, uma entidade que discute há vários anos a legitimidade de alguma lei e que, pela avaliação de seus consultores jurídicos, a perda continua a ser considerada improvável e, assim, nenhum registro de passivo foi efetuado até 31 de dezembro de 2005. Como os fatos geradores originários da tal lei continuam acontecendo, deverá a entidade fazer o registro de contas a pagar desses fatos geradores a partir de 1°. de janeiro de 2006?

O Ibracon entende que a essência da discussão ainda é a da lei original. Se nenhum fato novo ocorreu, que indique mudança na tendência do desfecho da discussão judicial, os fatos geradores novos devem ter o mesmo tratamento que prevalecer do julgamento para adoção inicial da NPC 22, discutida acima. Obviamente, se houver mudança nas circunstâncias ou na tendência do desfecho, não só os novos fatos geradores deverão ser registrados, mas também o valor acumulado da causa até 31 de dezembro de 2005 (“estoque”).

Nessa circunstância, a entidade estará diante de uma mudança de estimativa que não se relaciona com períodos anteriores nem representa correção de erro, e, portanto, de acordo com o item 34 da NPC 12, seu efeito deverá ser reconhecido no resultado do período em que ocorrer a mudança de estimativa.

São Paulo, 30 de novembro de 2006

Francisco Papellás Filho Ana María Elorrieta
Presidente da Diretoria Nacional Diretora de Assuntos Técnicos


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